08/04/2024

TJSP vai definir qual município pode cobrar ISS de 2018

Por: Laura Ignacio e Beatriz Olivon
Fonte: Valor Econômico
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) está para definir se são válidos autos
de infração lavrados pela Prefeitura de São Paulo por falta de recolhimento do
Imposto sobre Serviços (ISS) nos meses de janeiro e fevereiro do ano de 2018.
A decisão vai ser dada em recurso do município contra sentença favorável
obtida pelo Banco Alfa. Há pelo menos mais uma sentença e uma liminar obtida
por contribuintes.
A questão foi levada à Justiça depois de a prefeitura realizar, no fim de 2023,
uma ofensiva contra quase 120 prestadores de serviços que não recolheram o
ISS para o município no período em discussão. Passaram a ser exigidos os
valores devidos com juros de mora e atualização monetária.
A discussão envolve a Lei Complementar nº 157, de 2016, que deslocou a
competência para a cobrança do ISS do município do prestador do serviço para
o do tomador. A norma entrou em vigor no começo de 2018, porém, os
dispositivos que instituíram a mudança da competência foram questionados e
suspensos no Supremo Tribunal Federal (STF).
No mês de março de 2018, o ministro Alexandre de Moraes proferiu liminar
nesse sentido (ADPF 499, ADI 5835 e ADI 5862). Entendeu que a nova
disciplina normativa deveria apontar com clareza o conceito de “tomador de
serviços” ou geraria insegurança jurídica e a possibilidade de dupla tributação.
Só mais tarde, ao analisar o mérito, em junho do ano passado, o STF declarou
inconstitucional a alteração. Nasceu então a dúvida sobre qual regra valeria em
janeiro e fevereiro de 2018.
A Prefeitura de São Paulo entendeu que poderia aplicar a cobrança retroativa
do ISS referente aos dois primeiros meses daquele ano e lavrou as autuações
fiscais. No caso do Banco Alfa, a cobrança foi de R$ 60 mil.
Contribuinte teve que ir ao Judiciário para não ser punido por ter cumprido a
lei”
— Diogo Ferraz
Empresas e instituições financeiras apontam que a falta de modulação temporal
e a ambiguidade na definição de “tomador de serviços” pelo STF deram origem
à disputa.
A decisão favorável ao Banco Alfa foi concedida pela juíza Lais Helena Bresser
Lang, da 2ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo. Para ela, “a autora
providenciou o recolhimento no município do tomador, corretamente,
baseando-se na alteração legislativa vigente à época, não podendo subsistir o
auto de infração imposto pelo município de São Paulo, pois a LC nº 157/2016
é a lei que deve reger o presente caso concreto” (processo nº 1059165-
30.2022.8.26.0053).
A magistrada baseou sua argumentação no artigo 2ª da Lei de Introdução às
normas do Direito Brasileiro (LINDB), segundo o qual “não se destinando à
vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue”. Lais
considerou também que a suspensão da LC nº 157, de 2016, só ocorreu após o
recolhimento do tributo pelo banco em outros municípios.
Sobre o conceito de tomador de serviços, a juíza destaca, na decisão, a
aplicabilidade de uma norma da Fazenda municipal e da Lei Complementar nº
175, de 2020. “Embora o Parecer Normativo SF nº 2, de 2017, interpretasse
que o prestador de serviço seria o administrador do fundo e o tomador do
serviço, o fundo de investimento, posteriormente, com a edição da LC nº
175/2020, especificou-se a figura do ‘tomador dos serviços’ da atividade de
fundo de investimento, estabelecendo-se que o tomador será o cotista”, diz.
Ela também ressalta na decisão que uma solução de consulta editada pelo
Departamento de Tributação e Julgamento da Secretaria da Fazenda do
município de São Paulo (Dejug/SF), de outubro de 2018, teria gerado confusão.
Por meio da norma, de nº 41, o Fisco havia orientado o contribuinte que fez a
consulta a recolher o ISS ao município do tomador de serviços para os fatos
geradores ocorridos entre 1º de junho de 2017 e 22 de março de 2018 (data da
liminar do STF).
Segundo a advogada Jessica Chehter Brand, do escritório Schneider Pugliese, a
decisão é importante porque a discussão impacta bancos e seguradoras de
saúde, que seriam as mais autuadas por se destacarem, em valores, na
arrecadação de ISS. “Para muitas empresas, apesar de serem só dois meses,
trata-se de um montante significativo para o caixa”, diz. “Se o imposto já foi
recolhido para outro município, a empresa teria que pagar em dobro.”
Jéssica diz que a Prefeitura de São Paulo fez uma verdadeira corrida no fim do
ano. “Temos clientes que receberam questionamentos e intimações para
autorregularização. Esclarecemos, porém, que seria possível questionar no
Judiciário”, afirma. “Alguns pagaram mesmo assim e os que foram autuados
poderão usar essa sentença como precedente.”
Para o advogado Ricardo Godoi, que representou o Banco Alfa no processo, a
partir de março de 2018 só uma modulação do STF poderia salvaguardar o
Procurada pelo Valor, a Prefeitura não comentou as decisões obtidas pelas
gestoras de fundos.